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Saturday, November 12, 2005 

Da janela...

Ainda me recordo de ter visto que a janela estava aberta e hoje tenho a certeza de que tu também a viste. Estava aberta, mas não o suficiente para me perturbar. Nunca o suficiente para te perturbar. E assim seguimos em indiferença, afinal para nós era apenas e só uma janela.
Neste quarto que um dia foi nosso ainda se respira luxúria e desejos carnais, ainda te respiro quando fecho os olhos e te vejo chegar a mim. Ainda oiço os teus passos sobre o meu silêncio, ainda sinto o teu toque quando a noite tinha laivos de entrega e nos prendia em partilhas de cigarros, a nossa breve reconciliação com a finitude do acto em si e com a crueza dos nossos modos de sentir.
Nenhum de nós confessou quem deixou a janela aberta. Talvez tenha sido eu. Talvez tenhas sido tu. O teu lado da cama ainda sente a falta do teu corpo e eu neste momento ainda procuro encontrar o teu cheiro e o som das cores com que pintavas o encontro dos nossos corpos. Ainda procuro o teu cheiro no meu corpo, aquele aroma de proximidade e de suor com que me impregnavas enquanto fomos um só corpo, enquanto te olhava nos olhos e bebia o néctar da comunhão pelos teus lábios. E hoje respiro apenas o cheiro que a tua ausência provoca em mim. Esse cheiro que se mistura com o ar saturado de cigarros solitários.
Afinal a janela esteve aberta tempo demais para nós os dois e nenhum de nós pareceu reparar que enquanto esteve aberta tudo o que um dia foi nosso se desfez. O nós deixou de existir e deu lugar a um eu e a um tu diferenciados. E não houve surpresa, apenas constatações. Cruzaste a ombreira da porta, voltaste-te para mim e disseste-me para eu fechar a janela.

E a janela foi fechada! Nada mais havia para sair por ela e... e podiam sempre entrar as recordações que ferem como a luz branca da manhã nos olhos do despertar e o silêncio da noite nos ouvidos da solidão. Foi melhor fechá-la agora, já que ninguém a trancara antes! Mas a porta,... a soleira que alguém cruzou sem quase se despedir, manteve-se aberta... (Alguém poderia entrar...).
No interior do quarto, iluminado pela janela fechada, alguém esperou... e quantas vezes quase desistiu,... quantas vezes lhe apeteceu abrir a janela em par para que, pelo menos, a dor das recordações lhe fizesse companhia... Às vezes já nem olhava a porta, perdia a esperança que alguém alguma vez mais pudesse entrar por ela. E já nem queria um regresso...apenas um novo ingresso...um tímido olhar (porque deixara de acreditar em entradas triunfantes). E um dia, sem dar conta, olhando a porta vazia, ouviu alguém bater... Mas como, se a porta continuava vazia? Lembrou-se então da janela (a janela que manteve religiosamente fechada durante todo o tempo em que as esperanças se centravam na porta) e lá estava um olhar... um olhar novo, que deixava ver corpos quentes e almas entregues, suores escorridos em gotas de sensualidade e prazer, todo um novo horizonte em que o céu tocava o mar e em que os azuis distintos de ambos se fundiam a cada momento. Mantendo, contudo, cada um, as suas estrelas. Correu então para a janela, mas lembrou-se da porta:
- Tenho de fechar a porta, mais nenhuma corrente de ar me levará ninguém com ela.

Para que importam as janelas e as portas quando não vemos mais nada à nossa volta além do "nós"?!

Mas, depois, baixa o pano, acaba o momento perpetuado e sente-se a cama, o tapete, a janela...

Então, se não se sente o outro, por que não sair pela porta, deixá-la aberta e sair pela janela?!

:)

abre-se a janela,
vive-se nela
palavras soletram-se
no espaço aberto dela


um abraço de já madrugada...

Cheguei cá hoje. E fui literalmente absorvida pelos textos que encontrei. Li-os de uma assentada, sem parar, porque essa hipótese deixa de existir à medida que vamos desfiando as palavras...

De certeza que vou voltar... para espreitar pela janela...

Beijo ***

Janela fechada, porquê?, sinceramente não compreendo… Tudo o que escreves parece oposto, uma luta constante de desejo e negação…existe algo para sair, algo para entrar, desejo, recordações, silêncios…mas, existe sempre algo, uma simples brisa, um grão de areia que fecha ou não permite essas portas e janelas de um quarto que deseja ou necessita de estar vazio…
Não sei se foi interpretação, ou auto analise, foi o que pensei deste texto tocante. Um abraço

Belíssimo! Valeu a pena ter chegado aqui curiosa, e ficar, como num arrepio a ler esta tua prosa, cheia de poesia! Escreves muito bem! Beijinhos, continua...

Não conseguimos fechar uma janela se ainda estivermos debruçados no parapeito.

Mais importante: Não conseguimos abrir uma Nova janela, se continuarmos debruçados na outra janela.

Um beijo

Só para mandar um abraço, já te mandei aquilo do blog. vé la se gostas.
abraço, porta-te bem.
Pedro

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